Vicente Loureiro
Na verdade, são conhecidas como construtechs e proptechs. Agrupo-as pois, juntas, tratam de quase toda a cadeia produtiva da moradia. Segundo a Associação Brasileira de Startup, elas já respondem por cerca de 3% das aceleradoras tecnológicas existentes no país. Tem crescido muito. Só nos últimos cinco anos, multiplicaram-se por 3. E não param de nascer e principalmente de inovar. Algumas inclusive, apesar de muito jovens, com apenas 2 ou 3 anos de vida, já movimentam ativos na casa dos milhões de reais. Casos de sucesso instantâneo, quase mágico.
Calcadas na evolução da tecnologia e nas mudanças no modo de viver da sociedade, tais startups, voltadas para tornar os problemas do dia a dia mais fáceis, rápidos e baratos de serem resolvidos, prometem estar cada vez mais presentes no mercado da produção, comercialização e manutenção das moradias. As mais variadas possibilidades de serviços de delivery, e-commerce e mobilidade já disponíveis nos indicam que as transformações digitais seguirão impactando o comportamento das pessoas. Incluindo os relacionados ao modo de morar e as formas de obter e usar um imóvel para chamar de seu. Ainda que seu usufruto possa ser transitório, por vezes, quase até descartável.
As oportunidades e nichos para atuação das “habitechs” parece não ter fim no jeito de se viver no presente e futuro próximo das cidades. Apresentam-se para facilitar a contratação e gerenciamento de serviços de manutenção e melhoramentos das habitações. Para contratação de especialistas na concepção de projetos e demais serviços técnicos necessários e, até mesmo, para fornecimento de materiais e equipamentos a todas as etapas da obra. Aproximar contratantes de prestadores de serviços diversos é a missão deste grupo de startups. Elas parecem não conhecer limites para suas inovações e, nem tão pouco, nos tipos de comodidades que pretendem oferecer. Atuam como catalisadoras, fazendo das redes o ambiente e a fonte de seus negócios.
Um outro grupo de “habitechs” trabalha com plataformas destinadas a administração e gestão de imóveis. Usando de tecnologia para promover o morar ou o estar mais flexível e prático. Algumas, inclusive, adotando o sistema de moradia por assinatura. Permitindo alargar as possibilidades de escolha do onde morar e por quanto tempo. Incluindo a alternativa de mudar de imóvel quantas vezes o locatário quiser durante o contrato. Fazendo da expressão “lugar de morar incerto e não sabido” algo mais comum é aceitável. Emprestando ao “domicílio fixo” flexibilidade de CEPs sem fim. Exigir comprovante de residência ou assegurar domicílio eleitoral, nesses casos, pode soar tão surreal como o voto impresso e auditável. O mundo tech tem ódio e nojo do papel, assim como Ulisses Guimarães tinha da ditadura.
Há ainda “habitechs” focadas na compra, venda, locação, reforma e até financiamento de moradias. Com plataformas para gerar potenciais clientes para cada um dos tipos de demandas por eles apresentadas e lhes oferecer alternativas locacionais, de dimensões e de preços dos imóveis disponíveis. Na linguagem delas, um serviço de marketplace para estadias curtas ou longas, com inclusão ou não dos custos de condomínio, IPTU, água, luz, internet e até atendimento 24h. Anunciam ser possível encontrar a melhor solução de moradia para as necessidades de cada cliente, respeitando seus limites orçamentários. Uma delas chega a afirmar, baseada nos estudos de mercado por ela realizados, que existe um gap, da ordem de 20%, entre os valores pedidos pelos imóveis por seus proprietários e o real valor de mercado. Nos deixa a impressão de que a inteligência artificial, aplicada ao modo de viver nas cidades, pode produzir efeitos de redução dos seus custos. Tomara que seja verdade. Não custa, por enquanto, confiar em São Tomé.
*Vicente Loureiro é arquiteto e urbanista.