*João Bosco Won Held Gonçalves de Freitas Filho
A advocacia exerce papel relevante na atuação judicial e extrajudicial em favor do Poder Público, assim como na orientação e consultoria aos gestores públicos, para que cumpram as normas jurídicas e atendam ao interesse público.
Normalmente, a representação judicial do Poder Público é realizada por procuradores (advogados públicos) de carreira, que ingressam no serviço público mediante concurso público. No âmbito municipal, muitas localidades não possuem carreira de procurador, inexistindo procuradoria institucionalizada. Nessas situações, é comum que a defesa judicial seja feita por agentes públicos nomeados em cargos em comissão, escolhidos com base na confiança da autoridade pública, sem necessidade de concurso.
Questão relevante, que tem gerado intensa discussão, refere-se à possibilidade de o Poder Público contratar escritórios de advocacia ou advogados por inexigibilidade de licitação.
A inexigibilidade de licitação é uma forma de contratação direta, em que o Poder Público contrata o fornecedor sem licitação. Embora a regra geral seja a licitação, com julgamento objetivo da melhor proposta, a legislação permite, em determinadas situações, a contratação direta, seja por inexigibilidade, seja por dispensa de licitação. Ressalte-se que a ausência de licitação nesses casos não dispensa a abertura de procedimento formal tampouco o cumprimento das normas aplicáveis.
A inexigibilidade, inclusive para contratação de advogados, caracteriza-se pela impossibilidade de estabelecer critérios objetivos para selecionar a melhor proposta e a inviabilidade de competição entre fornecedores do serviço. Não é requisito que exista apenas um único prestador para a contratação por inexigibilidade, embora exista certa discricionariedade do contratante na escolha do prestador, baseada na confiança no serviço a ser prestado. Contudo, essa discricionariedade decisória exige fundamentação.
O Supremo Tribunal Federal (STF) admite a contratação de escritórios de advocacia por inexigibilidade de licitação, desde que cumpridos os seguintes requisitos: (i) procedimento administrativo formal para a contratação, com justificativa; (ii) serviço técnico especializado, prestado por profissional com notória especialização; (iii) serviço singular, como, por exemplo, em causas não rotineiras (observa-se que a nova lei de licitações, ao menos no texto, não exige mais a singularidade); (iv) dificuldade estrutural ou operacional para execução do serviço pela Procuradoria do ente; (v) honorários compatíveis com os valores de mercado.
Aliás, a simples existência de procuradoria institucionalizada, composta por procuradores concursados, não impede, por si só, a contratação de escritórios de advocacia por inexigibilidade, conforme entendimento jurisprudencial.
Questão sensível envolve os honorários advocatícios de êxito (com cláusula de sucesso) pactuados entre escritórios de advocacia e o Poder Público. Órgãos de controle, especialmente os Tribunais de Contas, têm sido extremamente rigorosos na análise desses contratos, impondo exigências e requisitos além dos fixados pelos precedentes do STF, que são de difícil cumprimento ou pouco atrativos para escritórios de notória especialização.
A ausência de critérios objetivos e de informações claras dos órgãos de controle sobre as particularidades dos contratos de honorários tem causado insegurança jurídica para gestores públicos e escritórios de advocacia. Portanto, embora seja possível contratar advogados e escritórios de advocacia por inexigibilidade, é essencial que o gestor público cumpra as regras e princípios aplicáveis ao tema.
*João Bosco Won Held Gonçalves de Freitas Filho é mestre em Direito e Procurador-Geral do Município de Nova Iguaçu.