CIDADES E O NATAL - Correio da Lavoura

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21 de dez. de 2021

CIDADES E O NATAL

Vicente Loureiro


Estima-se que a decoração de Natal é tradição de mais de 500 anos. Para alguns, até mesmo anterior a celebração cristã mais simbólica e fraterna. Desde sempre festejando os frutos da vida como o amor, a esperança, o perdão e a alegria. E os fazendo representar por frutas, avelãs, papéis coloridos, etc., sobre o tronco de um pinheiro, árvore símbolo da fertilidade e da vida perene, por suas folhas nunca deixarem de estar verde.

As comemorações só chegaram aos espaços públicos muito recentemente, em meados do século passado. Atualmente muitas cidades, quase todas, promovem algum tipo de decoração. Algumas fazem dela verdadeira atração turística. Enfeitando-se com milhões de luzes em dezenas de quilômetros de cordas iluminadas, desenhando guirlandas, sinos, estrelas bolas, renas, entre outros símbolos natalinos. Cobrindo árvores, postes, pórticos e realçando, aqui e ali, edificações notáveis, estendendo as festividades por até 60 dias com vasta programação de eventos e atrações diversas.

Presépios, cantatas e paradas natalinas, concertos musicais em igrejas e praças, casas de Papai Noel, mercados de Natal, espetáculos de luz, imagem e de dança fazem parte do calendário de eventos dessas comemorações, estendidas, quase sempre, de outubro a janeiro. Em algumas cidades, chegam mesmo a instalar pistas de patinação no gelo e parques de diversão, oferecendo passeios de trenzinho, corridas em rua temáticas e até voos em balões. Para os exageros, nenhum absurdo parece ser limite.

E os espaços públicos só já não bastam. Começam a aparecer parques de eventos destinados a receber programação natalina tão extensa quanto intensa. Batizados de Área , Reino ou Vila do Natal e, até mesmo, “Noéland”, entre outros, acabam por ofuscar o brilho espontâneo das iniciativas dos cidadãos de enfeitar suas casas e das prefeituras as ruas e praças mais importantes. Deixa de ser celebração de fé na vida, fica parecendo mais uma edição de uma exposição agropecuária qualquer, tipo festa do peão boiadeiro. Será Natal?

Em muitos casos, atropela- se o caráter simbólico dos elementos decorativos, esquecendo-se que as lâmpadas de “led”, assim como as velas e tochas do passado, iluminam os caminhos tirando as pessoas da escuridão das trevas, anunciando novos tempos de esperança e de paz. Esquecem também que os consagrados símbolos natalinos, a árvore as bolas e os sinos, tocam fundo a memória afetiva das pessoas, estimulando valores de solidariedade e partilha, expressando assim o espírito do Natal. Essencialmente uma festa cristã que, para alguns pensadores, já não tão evidente graças ao fenômeno da sua “laicização”, com preponderância dos aspectos comerciais sobre os de natureza cultural e religiosa.

Para além da polêmica, o fato é que vivemos de símbolos e sinais, através dos quais nossos pensamentos, fazeres, crenças e modo de agir são expressos. Os do Natal, em especial, nos afetam diretamente. Sejam nas árvores decoradas nos ambientes privados, sejam nas luzes e enfeites espalhados pela cidade. Provocam sensíveis reações, sentimentos e lembranças, nos aproximando dos valores cristãos para os que tem fé e humanitários para ateus e agnósticos. Impossível ficar indiferente a mais uma celebração da vida sobre a morte com o renascer da esperança por dias melhores e mais prósperos. Principalmente quando atravessamos tempos obscuros e sisudos como os de agora.

Feliz Natal querido(a)s leitore(a)s.

*Vicente Loureiro é arquiteto e urbanista.