A RAIZ DO PROBLEMA - Correio da Lavoura

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20 de jul. de 2021

A RAIZ DO PROBLEMA

Vicente Loureiro


Não é um clichê, posso lhes assegurar. De fato, o caso da raiz que desejo apresentar virou um problema. Não sei se a solução mais adequada seria o de cortar o mal pela raiz como nos ensina a metodologia de análise causa raiz (RCA). Aquela dos cinco porquês a serem respondidos para descoberta da razão e também para a identificação da solução apropriada, sem paliativos, dos problemas. 

Por que não? Porque, no caso, a raiz do problema é concretamente uma causa raiz, literalmente falando. Uma longa e petulante radícula de uma árvore da borracha (ficus elastica), proveniente da Ásia, e plantada, há uns 50 anos, diante de um classudo edifício em minha cidade. Na época, era moda o plantio dessa espécie em terrenos e vias públicas por conta talvez dos efeitos benéficos da frondosa sombra gerada e dos dotes de beleza e forma exuberante de cada uma delas. Não se fazia ideia ainda do comportamento agressivo e destrutivo de suas raízes.


Podendo atingir um raio de 30 metros a partir do caule, tais raízes problema não são muito de aprofundar-se no solo, preferem quase sempre a expansão lateral. Com sua robustez, vão rompendo barreiras sejam elas muros, paredes, alicerces, calçadas, tubulações, etc.. A ponto de algumas vezes no limite, imporem um xeque-mate: ou elas, as barreiras, ou eu. Uma tia, por exemplo, em certa ocasião, teve que fazer a escolha: ou se desfazia da figueira ou da casa. Claro, ficou com a casa e com o conserto de algumas rachaduras e pisos levantados pelas tais raízes, digamos voluptuosas.


Voltando ao caso em tela, agora o clichê foi proposital, perdoem-me, a pesquisa para se descobrir a causa do entupimento, com direito a refluxo, na bacia sanitária de um dos banheiros do tal prédio elegante, que abriga importante entidade de causas sociais, fez brotar a ponta de uma raiz de figueira tentando ultrapassar o sifão para florescer no vaso e ganhar o mundo, sabe-se lá com que destino. Chegou até ali rompendo a tubulação de esgotos e foi nutrida, na veia, por adubação anos a fio. Foi desenvolvendo-se a ponto, creio eu, de tentar deixar de ser Raiz e querer virar Nutella.


A Instituição, vítima dessas penetrações não consensuais em suas entranhas, vive de donativos e trabalho voluntário e está agora às voltas com mais um custoso problema: não saber onde plantar o vaso sanitário sem que ele volte a ter raiz e encontrar um novo jeito de escoar em segurança os efeitos do seu uso. Fico pensando, para dar ponto final a essa prosa, para onde vai a tal raiz? Irá esconder-se? Será asfixiada? Parece certo apenas que continuará na missão de ser raiz de problemas. Não mais desse, mas de outros, pois cada vez se tem mais consciência da inconveniência de se plantar figueiras em áreas urbanas. Há cidades inclusive que já proíbem essa prática. Portanto, não deve durar muito tempo o casamento entre os ficus frondoso e casarão alinhado. Infelizmente.

*Vicente Loureiro é arquiteto e urbanista.